Mais de 10 milhões de brasileiros deixaram de viver nessa condição em 2024, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Economistas explicam as razões para a queda

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A parcela da população brasileira que vive em situação de pobreza e extrema pobreza caiu em 2024 pelo terceiro ano consecutivo, segundo dados da Síntese de Indicadores Sociais divulgados na quarta-feira (3) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

O país alcançou, assim, os menores níveis de pobreza e extrema pobreza registrados desde o início da série histórica, em 2012.

  • 1,9 milhão é a quantidade de brasileiros que saíram da linha de pobreza de 2023 para 2024, segundo o IBGE.

  • 8,6 milhões é a quantidade de brasileiros que saíram da linha de extrema pobreza de 2023 para 2024, segundo o IBGE

O que os dados mostram

A parcela da população em extrema pobreza caiu de 4,4% para 3,5% — ou seja, 0,9 ponto percentual — entre 2023 e 2024, segundo os dados do IBGE. No mesmo período, a pobreza recuou de 27,3% para 23,1% — ou seja, 4,2 pontos percentuais.

Queda nos indicadores

Para definir pobreza e extrema pobreza, o estudo do IBGE adota parâmetros do Banco Mundial, com base no PPC (Paridade do Poder de Compra), indicador que calcula o poder aquisitivo em diferentes moedas.

Segundo esses parâmetros, é considerada em situação de pobreza a pessoa que tem rendimento domiciliar per capita inferior a US$ 6,85 PPC por dia — ou R$ 694 por mês. Já aqueles que têm rendimento domiciliar per capita inferior a US$ 2,15 PPC por dia — ou R$ 218 por mês — estão na extrema pobreza.

  • O rendimento domiciliar per capita é a soma da renda de uma casa dividida pelo número de moradores.

A pesquisa também mostra a disparidade entre regiões. No Nordeste, 39,4% da população vive abaixo da linha de pobreza. No Norte, esse percentual é de 35,9%. Já as proporções de pobreza nas regiões Sul (11,2%), Centro-Oeste (15,4%) e Sudeste (15,6%) são inferiores às do Brasil em geral (23,1%).

A pobreza atinge proporcionalmente mais as mulheres (24%) do que os homens (22,2%). As pessoas pretas e pardas, juntas, representam 56,8% do total da população e 71,3% dos pobres do país.

O que explica a queda na pobreza e extrema pobreza Para Rafael Ribeiro, professor de economia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pesquisador do Made-USP (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo), a redução da pobreza e extrema pobreza se deve a políticas sociais — como o Bolsa Família — combinadas com o aquecimento da economia, que se reflete no aquecimento do mercado de trabalho e na recuperação da massa salarial.

“A queda histórica da pobreza no Brasil está diretamente ligada ao aquecimento do mercado de trabalho. Com maior capacidade de absorver a mão de obra disponível, o país registrou em outubro a menor taxa de desocupação da série [histórica], de 5,6%”, afirmou ao Nexo João Gabriel Araújo, professor visitante do Programa de Pós-Graduação em Economia da UEL (Universidade Estadual de Londrina) e consultor macro do Banco Mundial.

Araújo afirmou que “o país se aproxima de um quadro de pleno emprego, com geração de renda para quem antes estava desempregado ou dependia de programas sociais, elevando sua renda acima da linha da pobreza”.

Desigualdade diminui, mas segue alta

A Síntese de Indicadores Sociais atualizou o índice Gini, que avalia a desigualdade na distribuição de renda. O indicador usa uma escala de 0 (igualdade máxima) a 1 (disparidade máxima). Segundo o IBGE, o Gini recuou de 0,517 em 2023 para 0,504 em 2024 — o menor patamar da série histórica.

Apesar da queda, o Brasil segue entre os países mais desiguais do mundo, segundo Araújo. “A concentração de renda permanece elevada, algo que se reflete, por exemplo, na nova proposta do IRPF [Imposto de Renda de Pessoa Física]: cerca de 15 milhões de brasileiros ficariam isentos, outros 10 milhões teriam redução nas contribuições, enquanto aproximadamente 200 mil passariam a ser tributados”, afirmou.

A nova regra do Imposto de Renda, já sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), isenta a cobrança para quem ganha até R$ 5.000 por mês. Em compensação, estabelece a alíquota mínima efetiva de 10% para quem ganha acima de R$ 50 mil.

No Brasil, o rendimento dos 20% mais ricos foi equivalente a 11 vezes o rendimento dos 20% mais pobres em 2022, ano em que a desigualdade teve queda, destacou o IBGE.

Segundo o instituto, o país apresentou a segunda maior disparidade nesse indicador entre 40 países selecionados pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), atrás apenas da Costa Rica (12,3 vezes). A média da OCDE foi de 5,3 vezes.

Ribeiro avaliou que, para resolver os problemas da pobreza e da desigualdade, é necessário promover medidas de curto prazo — como aprofundar políticas sociais direcionadas aos mais pobres — com outras medidas estruturantes de médio e longo prazo para aumentar a produtividade do setor formal da economia e absorver trabalhadores de classes mais baixas com postos menos precarizados.

“Deve haver medidas atreladas às parcerias público-privadas que garantam um aumento real da renda dos trabalhadores, fazendo assim com que a população passe a ganhar mais. Além disso, penalizar menos os trabalhadores com impostos sobre consumo, deixando o sistema de tributação sobre a renda progressivo, como sugerem as melhores práticas internacionais”, afirmou Araújo.